António Gedeão -
Poemas
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(chega à boca da cena, e diz:)
"Venho da terra assombrada, do ventre da minha mãe; não pretendo roubar nada nem fazer mal a ninguém. Só quero o que me é devido por me trazerem aqui, que eu nem sequer fui ouvido no acto de que nasci. Trago boca para comer e olhos para desejar. Com licença, quero passar, tenho pressa de viver. Com licença! Com licença! Que a vida é água a correr. Venho do fundo do tempo; não tenho tempo a perder.
Minha barca aparelhada solta o pano rumo ao norte; meu desejo é passaporte para a fronteira fechada. Não há ventos que não prestem nem marés que não convenham, nem forças que me molestem, correntes que me detenham.
Quero eu e a Natureza, que a Natureza sou eu, e as forças da Natureza nunca ninguém as venceu.
Com licença! Com licença! Que a barca se faz ao mar. Não há poder que me vença. Mesmo morto hei de passar. Com licença! Com licença! Com rumo à estrela polar."
António Gedeão, in Teatro do Mundo |